Entre as aptidões de um bom headliner de grandes festivais — vaga cada vez mais difícil de preencher mundo afora — estão: entregar um grande espetáculo musical, obviamente; surpreender o público; entreter aqueles que foram ao evento por outras atrações, mas resolveram ficar até o fim; ter um frontman carismático, que saiba trocar com os fãs; e, quando possível, dar provas ao espectadores de aquele show foi especial.

Pearl Jam fez isso e muito mais ao encerrar o segundo dia de Lollapalooza, em São Paulo, na noite deste sábado, diante de cerca de 100 mil pessoas no Autódromo de Interlagos.

Liderado por um (especialmente) falante Eddie Vedder, a banda americana mostrou aos mais jovens (alô, Imagine Dragons), por cerca de 2h20m, a definição de “banda de arena”. Abriu com uma sequência de pedradas sem respiros – “Wash”, “Corduroy” (que já ganhou a primeira de muitas jams da noite), “Do the evolution”, “Why go” e “Mind your manners” – até Vedder arriscar a primeira comunicação em português da noite.

— É uma benção estar aqui com essa galera incrível hoje. São tantas bandas legais. Obrigado, Perry Farrell, por ter inventado o Lollapalooza. Vocês estão na TV, então vamos acenar para as nossas família. Estamos adorando! — afirmou, fazendo referência à liberação dada em cima da hora para que o show fosse transmitido ao vivo.

Mais tarde, mostrando que o puxa-saquismo também é uma arte que domina, o cantor voltou a falar do chefão do festival, puxando um “happy birthday to you” – Perry completa 59 anos na próxima quinta-feira – e chamando-o para uma dobradinha em “Mountain song”, um clássico do Jane’s Addiction, banda de Perry, e da música alternativa americana.

Em comparação com o show da última quarta-feira, no Maracanã, o Pearl Jam optou por um repertório mais equilibrado tanto ao escolher músicas de diferentes fases da carreira quanto na divisão entre clássicos, canções menos conhecidas de sua discografia e covers (aqui vale a menção para “Pulled up”, dos Talking Heads, uma homenagem a David Byrne, que protagonizou show memorável no palco secundário, à tarde). Com isso, a banda soube administrar melhor a temperatura da atmosfera do espetáculo – como um tradicional público de festival, a galera vibrou em uníssono com sucessos como “Black”, “Jeremy”, “Alive” e “Better man”.

— Essa é uma das melhores plateias para quem já tocamos. Impressionante. Vocês fizeram o Brasil ser a capital mundial do rock and roll – afirmou Vedder, alternando o inglês sincero com o português ensaiado (ou melhor, escrito). O vocalista também fez discurso apoiando o controle da venda de armamentos nos Estados Unidos, exaltando quem participou da manifestação em Washington neste sábado (incluindo seus próprios familiares).

Em noite para lá de inspirada coletiva e individualmente (o que foram os solos de guitarra limpos e inventivos de Mike McCready? O que foi Vedder atendendo a pedidos da plateia e, mais tarde, servindo vinho à turma da grade?), o Pearl Jam se despediu de mais uma turnê pelo Brasil reforçando, ainda mais, seus laços com o Lollapalooza e com seu fiel público.

*texto de Luccas Oliveira de O Globo, distribuído pela Agência O Globo