A diretora Leticia Marques e a produtora Patricia Saltara, criadoras do documentário “Faça você mesma”, fazem parte de uma geração pioneira de meninas a pegar em guitarras, plugar amplificadores e gritar alto pelo movimento Riot grrrl. Quase trinta anos após seguirem as bandas de mulheres mais rebeldes dos anos 1990, as duas se juntaram com um time de garotas para registrar, pela primeira vez no cinema, a história da cena punk feminista no Brasil.

Boa parte do filme foi feito com recursos próprios, mas faltava verba para que o projeto pudesse ser finalizado. Assim, como era feito entre os grupos punk feministas, que se mantinham de forma independente e colaborativa, Leticia e Patricia estão reunindo verbas desde o começo de junho através de financiamento coletivo no Catarse para viabilizar o documentário.

— Senti necessidade de contar essas histórias. Afinal, se gente não for fazer esse filme, quem vai? — diz a diretora, que foi convidada no ano passado para tocar o projeto junto a Patrícia, com quem mantém amizade desde a adolescência. — Lembro que, em 2013, li o livro “Riot grrrl: revolution girl style now!”, da Nadine Monem, e fiquei com um sentimento de nostalgia. A partir daí, comecei a escrever um esboço, que acabou ficando de lado, até que veio o convite. Não ter me afastado desse grupo de meninas também ajudou. Acho que estamos fazendo isso na hora certa.

Até agora, o projeto tem com 95 colaboradores e conseguiu arrecadar R$ 6.795. Mas ainda é pouco. O objetivo é chegar a R$ 30 mil e, para isso, o filme conta com a ajuda de doações que variam entre R$ 20 e R$ 5 mil. Em troca, os “padrinhos” e “madrinhas” receberão uma série de recompensas, que variam de acordo com o valor investido no projeto, com estreia prevista em dezembro de 2018.

— Assim que finalizarmos o filme, a ideia é inscrevê-lo no circuito de festivais internacionais para, depois, partir para o circuito nacional. Mas ainda não há nada concreto — disse a diretora, apontando para a possibilidade de disponibilizar o documentário na internet. — Pensamos sim em explorar outras janelas e plataformas, como o Vimeo e o iTunes. Mas isso fica para o futuro — acrescentou.

MENINAS REBELDES

Houve um tempo em que mulheres eram subestimadas quando o assunto era rock, gênero dominado por homens até os dias atuais. Se por um lado acreditava-se que garotas eram incapazes de tocar guitarra tão bem quanto os garotos, do outro, nascia um movimento que provaria para o mundo que lugar de mulher também é na bateria, no baixo e onde mais ela quiser.

Assim surgiu o Riot grrrl, movimento criado nos Estados Unidos nos anos 1990 e popularizado por bandas como Bikini Kill e Tribe 8, que defendiam a expressão radical do feminismo através da música e da arte. Na mesma década, jovens brasileiras foram influenciadas pela atitude rebelde e empoderadora do punk, como conta Marina Pontieri, integrante do grupo TPM (sigla de trabalhar para morrer) e entrevistada no “Faça você mesma”.

— Nasci e cresci numa família bastante intelectual, meus pais eram feministas, e hoje vejo que fui privilegiada. Mas, claro, fora desse espaço, enfrentamos um cenário de pouquíssima representatividade. Eramos poucas bandas de mulheres versus centenas de bandas masculinas, ou com uma vocalista — explicou Marina.

Além da maioria masculina, a artista também revelou que “muitos machinhos do hardcore” torciam o nariz quando as garotas subiam ao palco. Mesmo assim, elas continuaram.

— Agora vejo que a união de garotas era muito mais empoderadora do que eu enxergava na época. É muito bacana ver que as jovens estão tendo ideias que não passavam pela minha cabeça aos dezesseis anos. E, neste sentido, acho importante que estas meninas saibam de onde veio tudo isso. Por isso o documentário é tão importante — completou.

Texto de Milena Coppi