Algumas inovações tecnológicas só revelam sua dimensão tempos depois. Em 21 de junho de 1948, a Columbia pôs nas lojas dos Estados Unidos, a U$ 4,85, um disco com o “Concerto para violino em Mi menor” de Mendelssohn. Trazia o violonista Nathan Milstein e o maestro Bruno Walter regendo a Orquestra Filarmônica de Nova York. O disco tocava na velocidade de 33 e 1/3 rotações por minuto (o padrão até ali era 78 rpm) e podia abrigar cinco ou seis canções de cada lado (e não apenas uma, como de costume). Era o primeiro LP da História. E esse long playing acabaria inaugurando toda uma nova era musical, a dos álbuns: obras de arte que se estendem por 40 e poucos minutos de audição e que tiveram seu primeiro exemplar mundialmente celebrado em 1967, no “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band” dos Beatles.

Setenta anos depois, era para ter virado peça de museu no decorrer de uma revolução digital que, sobretudo com o streaming, derrubou o meio físico como forma predominante de se consumir música. Mas o LP foi renascendo como produto de nicho nos últimos anos e, agora, entra numa nova fase. Em seu 12º ano de ininterrupto crescimento nos Estados Unidos, os discos de vinil terminaram 2017 respondendo por cerca de 8,5% das vendas totais de música no país (14% entre os produtos físicos, o que denota um crescimento de 3% em relação a 2016 — e um salto e tanto em comparação com 2005, quando sua participação foi de 0,9%).

Enquanto isso, a gigante Sony anunciou que vai voltar a produzir LPs ainda em 2018, no Japão, após um hiato de 28 anos. E o grande símbolo da nova cultura do vinil, o Record Store Day, celebrado em 21 de abril, bateu recorde de vendagem nos EUA: 733 mil LPs, ao longo de uma semana (desde 1991 não se vendia tantos álbuns de vinil por lá num mesmo intervalo de tempo).

No Brasil, o primeiro LP só foi editado em 1951. Era “Carnaval em Long-Playing”, com faixas de Heleninha Costa, Geraldo Pereira e Os Cariocas, entre outros. Mas o renascimento do formato também tem chamado a atenção. O país abriga duas das 65 fábricas de discos de vinil em operação no mundo. A Polysom, no Rio, completa 20 anos em 2019, produzindo de dez a 12 mil discos ao mês; e a Vinil Brasil existe desde o ano passado, em São Paulo. Além disso, o Brasil chega aos dias de hoje com pelo menos duas dezenas de pequenos selos fonográficos exclusivamente dedicados a lançar LPs, em tiragens de 300 a 2 mil cópias.

ENFIM, RENDENDO FRUTOS

Em todo o país, as feiras de discos se multiplicam pelas capitais e chegam às cidades menores. Em Porto Alegre, o Noize Record Club, iniciativa liderada pela revista de música “Noize”, lança sua 14ª edição, encartando o LP da cantora Xênia França. Enquanto isso, um marco para o vinil brasileiro está a caminho das lojas: “Tranquility Base Hotel and Casino”, novo álbum dos ingleses Arctic Monkeys. Desde 1996, quando os LPs deixaram de ser fabricados pelas grandes gravadoras no Brasil, um lançamento internacional desse porte não saía em vinil por aqui.

Presidente da gravadora Deck, que promove o lançamento de “Tranquility…”, e consultor da Polysom, onde prensa os álbuns de seus artistas, João Augusto começou a apostar no “negócio LP” ainda em 2009. Hoje, diz que sua insistência pessoal está enfim rendendo frutos.

— Nunca pensamos em lucros, mas eu não sabia que seria tão difícil fazer discos, ainda mais com qualidade. Se soubesse, provavelmente não teria entrado no projeto. A partir de 2012, a Polysom passou a fazer discos de vinil com qualidade reconhecida no mundo inteiro, ao mesmo tempo em que conseguiu chegar ao mercado com um preço um pouco menor, embora ainda acima do desejado. Hoje podemos dizer que valeu a pena — conta ele, que investe este mês também no lançamento do novo álbum de Elza Soares, “Deus é mulher”, agora em vinil.

Texto de Silvio Essinger, distribuído pela Agência O Globo