Texto de Carol Arci
Do trap ao samba e do sertanejo ao rock, o “Dia Brasil” inovou na programação do dia 21. O festival experimentou dedicar a data para juntar uma vasta variedade de estilos musicais diferentes e dar a oportunidade de apenas bandas brasileiras se apresentarem. A ideia era de fazer uma grande homenagem a música nacional na comemoração dos 40 anos do Rock in Rio.
A proposta era excelente e inclusiva. No entanto, será que funcionou? Essa fórmula agradou o público já conhecido da Cidade do Rock?
O mundo se renova e se atualiza o tempo todo. E é claro que o Rock in Rio, como um festival grande, precisa ficar atento sobre o que está acontecendo. Quais são as tendências? O que está em alta? É preciso ficar sempre atualizado para perceber o que agrada e o que já está ultrapassado.
Toda mudança traz um risco. E mesmo antes do dia 21 acontecer as polêmicas e dúvidas já se espalhavam. Os ingressos não se esgotavam e isso trazia preocupação aos organizadores. Ter um dia só com bandas brasileiras já é arriscado para um evento que é conhecido por trazer bandas internacionais ao festival. Misturar gêneros musicais totalmente diferentes, parece mais arriscado ainda. Piorou quando a maioria das apresentações acontecem só por participações especiais ou se resume a cada banda tocar apenas 3 músicas no palco.
O dia 21/09 foi do agrado de alguns, mas outros estavam longe de estarem satisfeitos.
É claro que existem as pessoas que vão apenas pelo evento, sem se importar com as bandas que vão tocar, mas essa parcela de público ainda é pequena. Em sua maioria, quem investe para comprar ingresso do Rock in Rio são os fãs que querem assistir um show completo do seu ídolo e gostam de coerência musical com as outras atrações do mesmo dia.
Ao conversar com algumas pessoas durante o dia, as opiniões podem se diversificar. Assim como algumas pessoas amaram a proposta da edição pela oportunidade de ver vários artistas brasileiros no mesmo dia, para outras, o efeito foi totalmente ao contrário.
O designer Felipe Paraíso, chegou cedo ao evento, entrou às 14h e não ficou nada satisfeito com o que vivenciou:
– Eu não gosto dessa “mistureba”, até porque ela limita o tempo dos artistas. Nós estamos curtindo um show que gostamos, mas o cantor está como se fosse um convidado. O artista vai lá cantar 3 músicas e não tem tempo de animar, envolver a galera. Foi uma mistura que foi avisada, mas acho que não funciona num festival como o Rock in Rio.
O designer ainda completa fazendo uma sugestão ao festival.
– Acho que seria interessante fazer um evento para cada estilo musical. Separar os eventos como o Rock in Rio, o Pop in Rio, o Sertanejo em Rio e etc… É preciso dividir por evento. Porém, se não for possível, que seja cada dia do Rock in Rio com um estilo musical em foco. Misturar sertanejo, rock, samba dentre outros em um dia só não funciona”, finaliza.
Em contra partida, há quem já garante o ingresso pelo festival em si e marca presença em todas as edições, independentemente das bandas que vão tocar.
O carioca Eduardo Rogers, um ávido fã do Rock in Rio e que também chegou cedo ao evento, afirma que não pensou duas vezes quando viu a opção do “Dia Brasil” entre as datas disponíveis do Rock in Rio na hora de fazer a escolha do dia e garantiu logo o seu ingresso.
– Sempre fui ao Rock in Rio pelo festival em si, mas sem me ligar muitos sobre as atrações. Quando anunciaram que teria um dia apenas com músicas brasileiras, não pensei duas vezes em garantir o meu ingresso para essa data – diz.
Algo inegável é que a maioria das pessoas que foram se divertiram devido ao leque de opções de atrações que Rock in Rio fornece. Porém, as atrações principais continuam levando a maior parte do peso da edição, por isso é importante ficar atento ao line-up na hora de montá-lo.
O “Pra Sempre Trap” teve um atraso de mais de 1h pra começar e por isso, todos os horários de shows posteriores, foram mudados. Houve até cancelamento da participação de Luan Santana no “Pra Sempre Sertanejo” devido a esse atraso do início. Porém, ao iniciar as apresentações, os mc’s foram bem recebidos pelo público que estava prestigiando o gênero, apesar das vaias pelo atraso. O auge das apresentações foi quando Felipe Ret entrou no palco.
Logo após o “Pra Sempre Trap”, foi a vez do “Pra Sempre Samba”, em que Zeca Pagodinho interagiu com convidados de peso como Alcione, Diogo Nogueira, Maria Rita, dentre outros. Porém, houve uma certa incoerência ao terminar a homenagem ao trap, com mc’s (em sua maioria idolatrado por fãs mais novos ligados à mídias sociais, Tik Tok e que admiram o estilo de vida “ostentação”) e logo após, iniciar o show do Zeca Pagodinho (que é totalmente contrário à cultura da ostentação).
Meio a falta de coerência agradando alguns e desagradando à outros, a roda de samba de Pagodinho foi formada e tomou conta do Palco Sunset. O cantor agitou o público com seu copo de cerveja do lado, recebendo os seus convidados e animando o público com seus maiores sucessos como “Vai Vadiar” e “Deixa a Vida me Levar”. Muitos fãs foram prestigiar o show do Zeca, levando cartazes, camisas personalizadas e alguns até com tatuagem para homenagear o sambista.
A cantora Carol Csan (confira o seu novo hit “Cê Sabe”) também foi prestigiar o evento como um todo, mas estava super ansiosa especialmente para ver o show do Zeca Pagodinho.
– O show do Zeca foi mais que especial, nostalgia pura! Teve muita emoção, entrega, músicos excelentes e muito carisma. Feliz em finalmente ver o samba no Rock in Rio”, completa
Após a apresentação do “Pra Sempre Samba”, foi a vez o “Para Sempre MPB” no Palco Mundo. Ney Matogrosso, Daniela Mercury, Gaby Amarantos, Majur, Baianasystem e Carlinhos Brown deram um show de qualidade musical, apesar de problemas técnicos de som enfrentados no palco em algumas apresentações. Daniela, Ney e Brown trouxeram hinos conhecidos do público, enquanto Majur, a primeira mulher trans a se apresentar no Palco Mundo, já chegou com força, mostrando todo seu talento, mesmo que em poucas canções. A cantora emocionou o público ao tocar piano e teve um cuidado especial com o visual da apresentação, combinando roupa, cenário, bailarinos e cantando ao vivo em uma apresentação emocionante. No geral, o “Pra Sempre MPB” entregou excelentes apresentações. As falhas ficaram apenas, por conta de erros técnicos do próprio evento.
Após o “Pra Sempre MPB” foi a vez do “Pra Sempre Pop” comandar o Palco Sunset. Os shows já estavam sendo aguardados ansiosamente pelos fãs, com nomes de peso como Lulu Santos, Ivete Snagalo, Luiza Sonza, Gloria Groove, Jão e Duda Beat. A cidade do rock já começava a esquentar e “levantar poeira“.
No entanto, mais uma vez, aconteceu uma transição de palcos sem muita conexão. Após terminar o “Pra Sempre Pop“, foi a vez do “Pra Sempre Sertanejo“. Comandado pelos consagrados cantores da música sertaneja brasileira, Chitãozinho e Xororó, os sertanejos tiveram a missão de segurar e entreter o público em sua maioria mais jovem do Rock in Rio. Com convidados como Simone Mendez, Ana Castela, Orquestra Heliópolis e Júnior, a dupla emocionou os fãs e admiradores que apreciam um bom sertanejo raíz e o vocal potente que se mistura em uma sintonia perfeita dos dois.
Apesar da falta de coerência musical de uma palco para o outro, o sertanejo teve o seu momento de brilho muito bem representado. É claro, que o auge da apresentação foi em “Evidências”, música que agrada desde os roqueiros aos pagodeiros, trazendo uma apresentação única e emocionante, apesar de ser uma aposta muito arriscada para ter mais de 1h de show para um estilo musical nunca testado no festival antes.
Porém, teve quem escolheu a dupla como preferida da noite. Foi o caso do carioca Eduardo Rogers, que se emocionou muito pelas músicas em si e por se lembrar do pai que não pode ir ao evento, mas que admira muito o som dos sertanejos.
– Dentre todas as atrações, eu destaco o show do Chitãozinho e Xororó que foi emocionante demais. Já estou ansioso para o próximo Rock in Rio!”.
Após o show sertanejo polêmico e com muitas emoções, foi a vez do “Pra Sempre Rap” dar início no Palco Sunset, outro momento esperado pelo público. Muitas pessoas já estavam posicionadas no local para aguardar a entrada dos rappers. Karol Conká estava afinadíssima com a banda, trouxe uma apresentação boa e músicas de empoderamento feminino. Também teve Djonga, Marcelo D2, Rael e Criolo. Marcelo D2 interagiu bastante com o público e agitou com alguns sucessos. Já Criolo emocionou com as reflexões da música que é quase uma poesia cantada: “Não Existe Amor em SP”. O coro que o público fazia cantando essa música foi um dos mais emocionantes do dia.
E finalmente, após o “Pra Sempre Rap”, foi a vez dos roqueiros, com especial do “Pra Sempre Rock” que contou com NxZero, Pitty, Capital Inicial, Rogério Flausino, Detonautas e Toni Garrido. A homenagem foi esperada pela maior parte do público do Rock In Rio do dia 21. Porém, infelizmente as pessoas já estavam cansadas devido ao atraso em efeito cascata que afetou toda a programação. A homenagem começou apenas lá pelas 2h da manhã e alguns fãs precisaram ir embora antes.
A moradora da Barra Olímpica, Bruna Paraíso, apesar de ir ao festival e morar perto do Rock in Rio, demonstrou muito cansaço nesse horário.
– A homenagem ao Rock me surpreendeu e animou muito. Foi um erro ter sido o último, e ainda mais com o atraso, porque era atração principal de muita gente, mas uma parcela teve que ir embora por conta do cansaço e porque ficou muito tarde”.
Mesmo já sendo tarde e de madrugada, a homenagem ao rock teve a maior quantidade de público assistindo no dia.
O público em geral curtiu o dia, mas com aquela sensação que poderia ser melhor. O fato de as apresentações serem curtas e desconexas não prendeu a atenção da maioria das pessoas por muito tempo, que ficaram dispersas. Dessa forma, o ‘Dia Brasil’ valeu a pena, embora não se sustente nos moldes atuais.
É preciso revisar as escolhas de line-up dos palcos principais, independentemente de ser banda internacional ou não, de acordo com o que o público do Rock in Rio realmente paga pra ver. E é necessário existir o mínimo de conexão entre as bandas. Porém, gostei da maioria das apresentações e da experiência de ver artistas consagrados da música brasileira em apenas um dia. A organização do evento está de parabéns quanto à locomoção, entrada e saída; não tive maiores transtornos. Sem contar com a limpeza impecável da Cidade do Rock. Outro ponto de destaque foi o Palco Favela que agitou muito a galera. Acertaram em cheio nas atrações. O que pecou mesmo em geral, foi um line-up muito desconexo nos palcos principais, com algumas escolhas erradas, problemas técnicos, atrasos e cancelamentos de apresentações.
De toda forma, o Rock in Rio continua sendo o melhor evento que já presenciei no Rio de Janeiro! Foi uma honra participar de mais uma edição!
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