Depois da tempestade, diz-se que vem a calmaria. Meteorologicamente podemos concordar, julgando pela chuva fina que começou a cair cedo, substituindo o temporal de ontem. Mas o lineup do terceiro dia de Lollapalooza não teve a menor intenção de deixar calmaria nenhuma.
O dia começou com a estreia da banda E a Terra nunca me pareceu tão distante, também sendo a primeira vez que uma banda totalmente instrumental, sem vocais, toca no festival. Também tocaram a paulistana Luiza Lian, com seu elogiado trabalho conceitual-diferentão, o grupo Aláfia, que celebra e incorpora os elementos e influências afro-brasileiras, e a dupla francesa de rock com cadência soul The Inspector Cluzo.
Às duas e dez da tarde, dois expoentes da música nacional fizeram grandes shows. No palco Adidas, o rapper BK’ vibrou os presentes com suas rimas de alto nível e participação de Luccas Carlos no palco – e o também rapper Djonga, escondido no meio do público, mas que teve seu disfarce desvendado por BK’ no meio da apresentação. Do outro lado do autódromo, a alternativa Letrux apresentou sua “noite de climão”, dançando e fazendo caras e bocas para um público que delirava, sem perder um teor político e consciente, falando contra a transfobia, fazendo referência ao ex-presidente Lula e lembrando a vereadora Marielle Franco. No final, até se jogou na galera.
Em seguida, Gabriel O Pensador apresentou o show mais lotado do horário em relação aos outros dias. O antológico artista passeou pela sua carreira de décadas e reverenciou outros artistas, como Charlie Brown Jr e Legião Urbana, suas canções politizadas na ponta da língua do público, em especial durante seus hits mais populares.
A carioca Iza fez sua estreia no festival com a turnê do disco “Dona de Mim”, que lhe rendeu uma indicação ao Grammy Latino, cantando grande parte dele na apresentação, somado a covers de Lady Gaga e Rihanna. Contando com um corpo de dançarinos, o show foi agitado, porém deu destaque ao maior ponto forte da jovem, que é a voz potente e poderosa. Perto do fim, contou com a participação de Marcelo Falcão no palco para entoarem o hino Pesadão, que reverberou através do público por toda a colina.
Enquanto isso, os ingleses da The Struts mostravam no Palco Budweiser como conquistaram tanta moral em apenas dez anos de carreira, colecionando elogios dos Foo Fighters até Motley Crüe. E assim como os veteranos, o público do Lolla se rendeu ao glam-rock do quarteto, que apresentou majoritariamente canções do disco “Young and Dangerous”.
Os novaiorquinos da banda Interpol cantaram logo depois, com uma apresentação classudona e um pouco distante, mas totalmente competente e que agradou os fãs mais apaixonados. Na sequência, Rüfüs du Sol, trio de eletrônica que vem se destacando nos últimos anos (com dois discos de platina para provar) atacou no Palco Adidas, tocando pela primeira vez no Brasil.
Pela primeira vez no Brasil, a banda Greta Van Fleet fez uma apresentação impecável. A banda era muito esperada e por mais que seja comparada a antigos clássicos, possui todas as qualidades próprias que tem direito. Não à toa esgotaram todos os ingressos das apresentações solo, no Rio de Janeiro e em São Paulo. Os instrumentistas são excelentes e os vocais de Josh Kiszka são sempre acertados. Os agudos do cantor arrepiaram e arrancaram aplausos. Agradou fãs e até os que não conheciam a banda.
Tocando pela segunda vez no festival, twenty one pilots foi um dos destaques da edição como um todo. A banda pôs fogo no palco do Lollapalooza – literalmente, pois sua cenografia envolvia um carro em chamas. Desde o início, deixaram claro para quê vieram. Servindo conceitos e talento, a dupla viu-se frente a uma colina lotada de gente pronta para ver o show, parte da turnê que apoia o disco “Trench”. Houve muita interação com a plateia. Ambos agradeceram, arriscando frases inteiras em português, o fato de terem sido convidados para o horário noturno depois de tocarem à tarde em 2016. A multiplicação do público reflete o crescimento da banda para os brasileiros, algo que foi retribuído quando tanto o vocalista Joseph Tyler quanto o baterista Josh Dun desceram para o público – algo que não foi muito visto esse ano. Tyler subiu na grade e cantou no meio da galera, enquanto Josh subiu numa plataforma com bateria também no meio do povo. A troca entre o palco e o povo ajudou a consagrar essa apresentação como uma das mais memoráveis do ano.
No encerramento da edição, Years & Years e Kendrick Lamar deram conta do recado. Ambos vieram pela primeira vez ao país para o festival, mas a banda britânica de eletropop, mesmo com um show ótimo e divertido, que desfilou as canções queridas do grupo e destacou os elogiados vocais de Olly Alexander, apresentou-se a um público reduzido devido à concorrência com o gigante do rap internacional. O show em si é bastante simples, contando apenas com alguns interlúdios em vídeo no telão, mas a empolgação do rapper foi o bastante par fazer a alegria dos que ocuparam toda a extensão do espaço frente ao Palco Budweiser. Kendrick, lamentando ter demorado para vir ao país e vendo a multidão berrar suas letras, emocionou-se. As lágrimas foram recebidas com aplausos mais entusiasmados ainda e o clima de amorzinho entre artista e plateia seguiu até o fim da apresentação, no bis, com a indicada ao Oscar “All the Stars”.
Na saída do festival, alguns cantavam “Eu não vou embora” no ritmo de Seven Nation Army. O sentimento e gostinho de quero mais ficaram após três dias diversificados em estilos e gêneros. Tendo passado por seus pontos altos e baixos, no fim das contas o público do Lollapalooza finaliza mais uma edição esperando pela próxima.
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