Aos 42 anos, a paulista Gabriella Argento se destaca em meio aos jovens reunidos na tenda que serve como área de convivência e de treinamento para o elenco de “Amaluna”. No novo espetáculo do Cirque du Soleil, que chega ao Parque Olímpico, no Rio, no próximo dia 28, depois de uma temporada de dois meses e meio de casa cheia em São Paulo, Gabriella faz o papel de Maïnha, ama seca da jovem protagonista e alívio cômico de uma história de amor. Mais “gordinha” do que a média, como ela mesma se classifica, a atriz tem pedigree de palhaço e diz que foi escolhida pela companhia justamente por seu tipo físico:
— Foi minha treinadora de palhaço que me obrigou a fazer o teste para o Cirque du Soleil, em 1997. Era a primeira audição deles no Brasil. Eu só tinha 22 anos e estava estudando fazia pouco tempo. Fui a única aprovada, mas eles não me chamaram logo de cara, minha ficha ficou em um banco de dados. Em 2004, eu estava em casa, deprimida por causa de uma separação, quando um aluno me disse que os caras tinham colocado anúncios em todas as escolas de circo me procurando. Era para um espetáculo chamado “KÀ”, em Las Vegas, em que eu fazia umas acrobacias muito difíceis. Depois de “Varekai”, “Amaluna” é o meu terceiro trabalho com eles.
MARINHEIRO BRASILEIRO
Em “Amaluna”, a ex-integrante da trupe Doutores da Alegria e do grupo de improviso Jogando no Quintal vive um caso de amor em tom cômico que costura todo o espetáculo e faz contraponto à narrativa central. Inspirada em “A flauta mágica”, de Mozart, e em “A tempestade”, de Shakespeare, a história se passa na ilha de Amaluna, governada por mulheres, em que a jovem filha da rainha, Miranda, se apaixona por um náufrago de origem nobre, Romeo. Antes de se unirem, no entanto, ambos passam por diversas provações. É onde entram os números circenses de monociclo, equilibrismo, barras, acrobacia, torre humana e prancha.
Além de Gabriella, o elenco de cerca de 50 artistas de “Amaluna” tem outro brasileiro, o ex-ginasta mineiro Gabriel Christo, de 29 anos. Ele atua como um dos marinheiros da tripulação que naufraga em Amaluna. O grupo faz o número da prancha, em que os acrobatas se revezam em saltos que podem chegar a até seis metros de altura.
Christo foi atleta da seleção brasileira de trampolim e não conseguiu classificação para ir às Olimpíadas de 2008, em Pequim. Na sequência, ligou para o olheiro do Cirque du Soleil que o havia visto, anos antes, em 2006, em uma competição no Canadá. Foi o início de uma carreira que o ex-atleta pretende manter enquanto puder, já que o esforço físico a torna muito curta.
— O circo é muito mais valorizado lá fora do que aqui. Na Europa e nos Estados Unidos, eles têm companhias maravilhosas. No Brasil, os circos não são valorizados e os artistas trabalham em condições precárias, muitas vezes no sacrifício e pelo amor ao que fazem. Eu gostaria que, com a vinda do Cirque, isso fosse mais valorizado — diz ele, que também trabalhou em “Varekai”, penúltimo espetáculo que a companhia trouxe para o país.
Sexto espetáculo do Cirque du Soleil a desembarcar no Brasil, depois de “Saltimbanco”, “Alegria”, “Quidam”, “Varekai” e “Corteo”, “Amaluna” foi concebido pela americana Diane Paulus e estreou em 2012, em Montreal. Desde então, passou por 30 cidades de dez países e foi visto por mais de 4 milhões de espectadores.
LEMBRANÇAS CARIOCAS
O título funde as palavras “ama”, que em algumas línguas significa “mãe”, e “luna”, cuja tradução é “lua”, e dá nome à misteriosa ilha onde tudo acontece. A simbologia remete ao protagonismo eminentemente feminino do show, que tem mais de 60% do elenco formado por mulheres, incluindo nessa conta uma banda só delas.
— É importante um espetáculo como esse ter uma banda formada só por mulheres — diz a guitarrista britânica Rachel Wood, líder do grupo. — No Reino Unido, há muitas oportunidades para as mulheres, mas em geral eu era a única das bandas em que tocava.
Para a percussionista canadense Mireille Marchal, que também faz parte da porção musical do espetáculo, a chegada de “Amaluna” ao Rio tem um sabor de volta para casa. Em 1992, interessada no carnaval, Mireille morou na capital fluminense durante três meses e meio — sem interlocutor que falasse inglês ou francês na casa em que ficou, aprendeu bem rápido a língua portuguesa, conta. Com base de jazz, ela é fã também de MPB, de Gil, Bethânia, Gal Costa, Caetano, Ivan Lins, Rosa Passos e Marisa Monte, entre outros. Amiga da dupla que assina a trilha do show, Guy Dubuc e Marc Lessard, ela colocou elementos brasileiros nas composições:
— No número dos monociclos, que abre o espetáculo, eu toco chocalhos e triângulo. Então, isso é algo que eu trago da minha experiência aqui e da minha influência pela música brasileira — afirma ela, que está na companhia desde 1992, quando fez “Alegria”.
A temporada carioca de “Amaluna” vai até o 21 de janeiro. Os ingressos estão sendo vendidos no Shopping Metropolitano até o dia 26; depois disso, só na bilheteria do Parque Olímpico.
“Amaluna”
Onde: Parque Olímpico — Av. Embaixador Abelardo Bueno, s/nº, Barra da Tijuca. Quando: De 28/12 a 21/1; ter. a sex., às 20h, e algumas sessões extras às 16h30m; sáb., 16h30m e 20h; dom., 16h e 19h30m. Quanto: R$ 250 a R$ 450. Classificação: Livre
Texto de Alessandro Giannini, distribuído pela Agência O Globo
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