Dois jovens fãs à beira do palco acompanham a apresentação atentos. Entre uma canção e outra, gesticulam para chamar atenção do artista, que lhes joga uma palheta. Os meninos agradecem fazendo exagerados gestos de veneração. Com eles, uma multidão de jovens até idosos reuniu-se para assistir Jorge Ben Jor e a Banda do Zé Pretinho, de volta ao Rio de Janeiro após a turnê com Céu e Skank na qual Jorge fora homenageado.
Serão duas noites de apresentações no Circo Voador, sexta e sábado. Nesta noite de sexta-feira, o público, tão heterogêneo quanto alguém como ele pode convocar, o recebe calorosamente. São pessoas de variadas idades, cores, tamanhos e classes. A plateia conta até mesmo com estrangeiros – muitos deles – que aproveitando a passagem pela cidade vêm assistir Ben Jor no palco dos arcos da Lapa. Há programa mais carioca que esse?
As primeiras duas canções da noite têm seu significado: “Jorge da Capadócia” é seguida por “A Banda do Zé Pretinho”, assim como artista e banda estruturam a apresentação em conjunto, pois os instrumentistas da companheira de longa data de Jorge estão lá para serem parte da dinâmica do show tanto quanto ele. Noite adentro, Ben Jor, o público e a banda brincam um com o outro.
Público esse que dança, balança e canta “Santa Clara Clareou” e “Zazueira” com os músicos, viajando pela discografia do cantor, aproveitando “Ive Brussel” para mostrar o que sabe de samba, seja muito ou pouco. É notável a ausência de telefones levantados ao ar, apontados para os artistas, como o Circo Voador (e qualquer casa de show) está acostumado a ver em 2017. Os registros fotográficos e vídeos ficam em segundo plano; a prioridade é fazer coro com o icônico refrão de “Mas Que Nada”.
As respostas imediatas às irreverências do babulina mostram o poder que ele tem, aos 72 anos, de seduzir o público com uma energia que ignora sua idade. Joãozinho da Percussão mostra que não fica muito atrás, arriscando uma dancinha através do palco enquanto a plateia comemora. O momento é seguido pelo “uh, uh” de Ben Jor que nada demoram em ouvir um “que beleza” a plenos pulmões como resposta. O cantor divide os vocais com o baterista e cada instrumento tem seu solo, seguido por um elogio de Jorge e convocação para aplausos.
Se parecia impossível que o público ficasse ainda mais animado, a tríade “W/Brasil”, “País Tropical” e “Do Leme Ao Pontal” mostra que ninguém veio mesmo para ficar parado. O palco iluminado em verde e amarelo presencia cada palavra das canções ser entoada em alto e bom som, em um dos picos de maior energia da noite. Acalmando a multidão, engaja-se em um ritmo mais lento com “O Circo Chegou” em homenagem à casa, sucedida pelo único momento em que Jorge para a música e conversa com o público, dividindo sua história no Circo Voador com os presentes e destacando uma de suas apresentações com Tim Maia com muito orgulho antes de seguir com o show. É uma conversa de bar, entre amigos, na Lapa. Típico Rio de Janeiro.
É um roteiro clássico para as apresentações de Jorge das últimas décadas, mas que mostra a versatilidade do carioca que passeia com muito suingue de um estilo para o outro, profissional e atemporal, com muita ginga e alegria. A noite voa, e outros destaques ficam por conta de “Take It Easy” e “O Homem da Gravata Florida”, esta última com seu ar sóbrio, iniciada no piano, lentamente incorporando os outros instrumentos.
Caminhando para o fim do show, um medley temático de futebol que culmina em “Fio Maravilha” mostra que mesmo próximo às duas e meia da manhã o público mantém sua imensa troca com cantor e banda. Em seguida, Jorge convoca as meninas, o que significa uma corrente de mulheres de toda as idades, cores e tamanhos correndo em direção ao palco. Uma vez em cima, elas fazem a festa no meio da banda, seja dançando, cantando, tirando selfies ou tascando beijinhos na bochecha de Jorge Ben ao som de “Gostosa”.
A multidão no Circo ainda tem energia de sobra para encerrar o show com “Taj Mahal” do mesmo jeito que iniciou – pulando alto. A música conta até com a participação vocal das mulheres no palco. Jorge Ben agradece o público e, reprisando “A Banda do Zé Pretinho”, despede-se com um “até amanhã, se Deus quiser”, desaparecendo no meio das meninas. A atmosfera eletrizante prova a relevância do ícone da música popular brasileira, em sua sexta década de carreira, capaz de cativar todo tipo de gente outra vez. Mais que isso, lembra a capacidade do carioca em manter sua energia, sua garra e seu jeito profissional de ser informal, levando simpatia e positividade adiante. Lição importante para se manter na cabeça em dias como os que vivemos.
Jorge Ben Jor
21 de julho de 2017
Circo Voador, Lapa, Rio de Janeiro
Não há comentários enviados