Estava escrito, como nas calçadas musicais de Vila Isabel: reunir Martinho, Monarco, Jorge Aragão, Alcione e outros ao som de sambas clássicos, em uma homenagem ao centenário do gênero, não tinha como dar errado. Não deu mesmo, mas, com alguns detalhes a mais, um belo show seria uma noite antológica, quando o Rock in Rio se curvou ao samba.
O Jongo da Serrinha, com seus integrantes vestindo lindas roupas estampadas à moda africana, abriu a festa, lembrando as origens do samba e o morro onde foi fundado o Império Serrano, em 1947. Em seguida, Martinho da Vila, que completa 80 anos na próxima segunda-feira de carnaval, trouxe sua simpatia, sua voz característica e a poesia de “Canta, canta, minha gente”, seguida pelos clássicos “Pelo telefone”, de Donga, considerado o primeiro samba gravado, em 1916, e “A voz do morro”, de Zé Keti. Não se pode dizer que Martinho não pode bater no peito e dizer “Eu sou o samba”.
Em família, ele recebeu a filha Mart’Nália, que homenageou Luiz Melodia, morto no mês passado, com “Estácio, holly Estácio”, e Dona Ivone Lara, com a dobradinha “Alguém me avisou/Sonho meu”. Até aí, o público cantava e sambava junto com os artistas.
A entrada de Criolo, que, paulistamente, interpretou Adoniran Barbosa (um cantor de nome Criolo cantando as composições de um paulista de origem italiana em um tributo ao samba no Rock in Rio é praticamente um resumo do Brasil) deu uma certa esfriada no terreiro.
As duas canções – os clássicos “Tiro ao Álvaro” e “Saudosa maloca” – não eram tão conhecidas do público, principalmente a segunda, e o cantor não parecia à vontade, pedindo energicamente uma reação da galera, que não veio.
A voz redonda de Monarco, 84 anos, deu uma levantada no astral, mas “Vai vadiar” e “Coração em desalinho” padeceram de uma certa falta de punch, assim como, seguindo o roteiro portelense, “Foi um rio que passou em minha vida” e “Portela na avenida”, com Roberta Sá. Em ambas, faltou aquele cavaquinho mais nervoso, aquela percussão furiosa.
A Marrom Alcione, em plena forma, como o piston do clássico da gafieira, tirou a surdina e pôs as coisas no lugar, com “Gostoso veneno” e “Exaltação à Mangueira”, entregando a tocha em chamas para Jorge Aragão, que pôs mais lenha no fogueira, atiçando a banda a pisar no acelerador com “Coisinha do pai” e “Vou festejar”, antes da volta de todos ao palco para a inevitável “Aquarela brasileira”, de Silas de Oliveira, marcando o começo e o fim da homenagem no Império Serrano. Nove, nota nove.
Texto de Bernardo Araujo (Agência O Globo)
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