Para alguns fãs e críticos, o Radiohead bem poderia ter ficado congelado em cápsulas criogênicas, cristalizado na angústia fin du millénium que tão bem soube expressar em álbuns como “The bends” (1995) e “OK computer” (1997). Mas o tempo passou, o grupo inglês avançou em direção à descontrução, e meio que se perdeu em experimentalismos autoindulgentes. Esta edição comemorativa com o acréscimo de três canções – canções mesmo – inéditas (“Lift”, “I promise” e “Man of war”) e oito lados B lançados na época (quando os singles saíam com dois lados, ainda que, em sentido figurado, no caso dos CDs) realiza a fantasia dessa parcela da torcida e também de muitos que enxergaram e ouviram em “OK computer” aquele negócio nebuloso e duvidoso chamado “o futuro do rock”.

Aos 49 anos, Thom Yorke, líder do Radiohead, entrou na história do gênero como uma espécie de homem que não quis ser rei, abdicando do direito de herdar do suicida Kurt Cobain (1967-1994) o trono maldito. Tal rejeição ajuda a entender porque sua banda preferiu deixar uma música tão poderosa como “Lift” de fora dos lançamentos do grupo, mesmo em discos de seca criativa como “King of limbs” (2011). A letra fala sobre estar preso no elevador, com um aceno autoirônico ao Major Tom de David Bowie: “Estamos tentando falar com você, Thom”. Sua exclusão de “OK computer” só pode ser explicada por possível redundância com o clima de outras canções que se tornaram clássicos do Radiohead, como “No surprises”.

“I promise”, com delicadeza ao violão e ao mellotron, dá perfeita continuidade às “depressongs” do grupo, repletas de imagens claustrofóbicas, que contrastavam com a euforia britpop do Reino Unido de Tony Blair e da ilusória pax americana da era Clinton. Pode ser interpretada como uma canção de amor, mas suas juras de regeneração em falsete não enganam ninguém: “Eu não vou mais fugir, eu prometo/ Mesmo quando eu ficar entediado, eu prometo/ Mesmo quando o barco quebrar, eu prometo/ Me amarre ao convés apodrecido, eu prometo”. As metáforas náuticas (alô, Jorge Aragão!) também estão em “Man of war” (“man’o’war” era um navio de guerra inglês), com arranjo de cordas e aqueles acordes tristes de piano a serviço de uma canção estupendamente construída. Sem redenção nenhuma: “Sim, os vermes virão pra você”, avisa a letra.

O resto é mar, lados B de notória fama entre os fãs (“Palo Alto”, “Lull”, “Pearly”) e um álbum velho conhecido de beleza desoladora que há vinte anos parecia avisar aos otários do triunfalismo “fim da história”: se segura, que daí pra frente, lixo ocidental, pode ser ladeira abaixo.