A atual turnê de Roger Waters, que percorre a América do Norte há dois meses, costuma ter no setlist quatro ou cinco músicas de seu novo disco, “Is this the life we really want?”. No meio de clássicos como “Time”, “The great gig in the sky”, “Wish you were here” e “Money”, entram, sorrateiras, novidades como “Déjà vu”, “The last refugee” e “Smell the roses”. Chamada “Us + them”, a excursão, como sempre, está bombando, com novas datas sendo anunciadas em cidades como Chicago, Filadélfia e Vancouver. O fã menos alucinado de Waters e de sua antiga banda, o Pink Floyd, possivelmente não vai perceber que aquela canção no meio daquelas outras não é um clássico de antanho.
No disco novo — composto e gravado ao longo dos últimos sete anos —, Waters mantém o clima depressivo do velho Floyd, em baladas de violão com arranjos de orquestra (assinados pelo badalado David Campbell), ambientadas por diálogos e sons, como se fossem a trilha sonora de um filme. Tudo isso, é claro, com a principal bandeira política do músico como inspiração: o combate a Donald Trump (cuja voz abre a faixa-título, na famosa fala em que o presidente justifica sua eleição, falando “story after story after story…”) e a outros responsáveis, na visão dele, pelos sombrios tempos atuais (a capa do disco já foi usada até para protestar contra o presidente brasileiro, Michel Temer, nas redes sociais). Uma das principais causas políticas do músico é o boicote que ele propõe a Israel, que já causou tretas com Caetano & Gil e, mais recentemente, com Thom Yorke, do Radiohead.
Pink Floyd e tempos sombrios? É claro que “Is this the life we really want?” não poderia ser um disco alegre ou positivo, e disso Roger Waters entende: o músico de 73 anos pegou seu violão, azeitou a voz grave e mandou uma série de baladas deprê de levar às lágrimas qualquer apresentador de programa infantil: “Déjà vu”, “The last refugee”, “Part of me died”, “Broken bones”, com eventuais mudanças nos arranjos, mas o clima é aquele que quem ouve “Money”, “Us and them” e outros clássicos floydianos conhece bem, há décadas.
O problema é que as músicas novas, embora tenham a clara assinatura de Roger Waters, não têm a qualidade das antigas, não contam com David Gilmour, Richard Wright, Nick Mason, velhos companheiros que, no mínimo, davam um colorido (mesmo que acinzentado) às composições. Não há, em “Is this the life…”, um solo de guitarra surpreendente, e mesmo passagens mais próximas do rock progressivo, como em “Picture that”, provocam mais um suspiro de saudades do que exatamente o prazer de se ouvir uma novidade de um ídolo. De qualquer forma, trata-se de um genuíno RW, e espera-se que o próximo não demore mais 25 anos.
Cotação: Regular.
por Bernardo Araujo, distribuído pela Agência O Globo
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