Como o Coldplay foi da bela melancolia introspectiva dos primeiros álbuns para canções que pesam a mão na vibe super positiva sobre a vida? Dos arranjos em que os teclados dividiam as atenções com momentos acústicos à incorporação das batidas eletrônicas dance?q

Ao revisitar a carreira da banda, concluímos que o Coldplay mudou da água para o vinho, ou do preto e branco para a paleta vibrante de cores, são praticamente bandas distintas. Mas um ponto é certo: ao longo da trajetória, os caras aprenderam a montar um senhor espetáculo para as massas.

Mas antes da atração principal, Tiê deu as boas-vindas ao pessoal que chegou cedo e foi festejada pelo público, principalmente ao apresentar “Isqueiro azul” e “A noite”. Acompanhada de uma banda competente, conseguiu ajudar o público a lidar com a ansiedade pré-show, que retribuiu cantando junto.

Depois, a cantora londrina Lianne La Havas fez uma apresentação classuda, bem recebida pelos presentes, o que a deixou visivelmente satisfeita. Não havia como ser indiferente ao suingue de canções como “Unstoppable”, Green and gold” e “Grow”. Lianne ainda incluiu no setlist o hit universal “I say a little prayer”, unindo gerações que tanto já apreciaram essa música nos mais diversos estilos. Alto nível.

Faltando pouco para o início do show, a ansiedade aumenta na medida em que o espetáculo começa a ser dirigido por instruções de uso nos telões para as Xylobands, as pulseiras de LED controladas remotamente, distribuídas ao público e que roubaram a cena em diversos momentos.

O tom épico com a introdução de “O mio babbino caro”, na voz de Maria Callas, foi definitivo para deixar o público extasiado: showtime! Munido das pulseiras, o pessoal delira quando estas se acendem e evocam o Coldplay, que invade o palco com “A Head full of dreams”, do disco homônimo. A banda comandaria pelas próximas duas horas o festival de hits, belos jogos de luzes, imagens caleidoscópicas, pirotecnia e mais dois palcos, numa verdadeira overdose para os sentidos.

Em seguida, “Yellow”, no momento “todo mundo canta junto”, com direito a tentativa de flashmob com os balões amarelos, que ficaria mais bonito se a adesão fosse maior (mas claro que isso não prejudicou). “Every teardrop is a waterfall” emendou com o compromisso de não deixar ninguém disperso, e encantou com a primeira chuva de papel picado da noite.

Do frenesi à introspecção, a bela “The scientist”, foi engenhosamente encaixada como numa espécie de descanso para mais festa, e rendeu um coro empolgado dos presentes, que deixou Chris Martin satisfeito com o que via. Era apenas o começo, dando indícios de que o setlist tentaria conciliar novidades com músicas mais antigas.

Mas o repertório não foi muito diferente do visto em shows anteriores e privilegiou músicas a partir de Mylo Xyloto (2011). “A Head full of dreams” (2015) contribuiu com sete músicas, evidenciando que a recepção não poderia ser melhor a esse Coldplay de bem com a vida, que existe em um universo paralelo onde tudo é lindo e colorido.

Alguns dos pontos altos do show foram em “Birds”, “Hymn for the weekend”, “Paradise”, “Viva la Vida” e “Clocks”. A maratona contou ainda com a “participação” no telão da peso pesado pop, Rihanna, em “Princess of China”, e uma cover para “Heroes”, do saudoso David Bowie, um tanto decepcionante. Mas, setlist que segue.

Um ponto a favor do Coldplay sem dúvida é a energia, sem muitas pausas entre uma canção e outra, exigindo comprometimento dos presentes para acompanhar. E claro, a simpatia de Chris Martin, bonitão e simpático, sempre falando por ele e pela banda, da satisfação de estar no Rio e fazendo aquela média ao dizer o quanto os cariocas são incríveis. Apesar da empolgação, houve um momento de quebra na animação, quando a banda se posicionou no terceiro palco e propôs um momento mais intimista, com “Parachutes”, que não aparecia nos setlists desde 2011, e “Shiver”, ambas do primeiro álbum.

Mas o balde de água fria veio com a música apresentada atendendo a pedido de fã, resultado de uma ação da banda nas redes sociais. “A message”, um b-side saído de “X&Y” (2005), foi o momento em que o pessoal colocou o papo em dia, checou se as fotos do show estavam boas ou foi a deixa para pegar aquela cerveja.

Seguindo o roteiro, o grand finale reservou para “A sky full of stars” um pedido triplo de casamento: a música é pausada e os três casais dizem “sim” em cima do palco, para mais de 60 mil testemunhas e a benção de Chris, para delírio dos românticos incorrigíveis. A canção ainda reservaria um show de lasers, das pulseiras e uma chuva de papel picado, cortado em forma de estrelas (!) “Up&up” encerra a apresentação, com direito a invasão do palco por fã, que consegue tascar um beijinho em Chris Martin, que ao ver o desespero (e a truculência) dos seguranças, leva a situação numa boa pedindo tranquilidade. Afinal, o rapaz só queria dar um beijo, né?

Foi a despedida de uma noite que será inesquecível para muitos, mas não necessariamente pela música, que foi apenas mais um elemento entre tantos usados para o espetáculo promovido pelo Coldplay. Se é bom, ruim ou apenas uma demanda para o entretenimento de uma época em que o conta, é a experiência? Bem, pelo menos sabemos que de megashow, os caras entendem.

COLDPLAY
Maracanã, Rio de Janeiro
10 de abril de 2016

Setlist:
A Head Full of Dreams
Yellow
Every Teardrop Is a Waterfall
The Scientist
Birds
Paradise
Everglow
Princess of China
Magic
Clocks
Midnight
Charlie Brown
Hymn for the Weekend
Fix You
Heroes
Viva la Vida
Adventure of a Lifetime
Kaleidoscope
Parachutes
Shiver
A Message
Amazing Day
A Sky Full of Stars
Up&Up