Numa semana com acontecimentos conturbados na política brasileira, o show do Dead Fish que já é incendiário, ficou nessa sexta-feira, no altar sagrado do Circo Voador, uma bomba relógio pronta para ser detonada a qualquer momento.

A noite começou com os shows de abertura muito competentes da Statues On Fire mostrando um hardcore sem firulas e a incrível Menores Atos apresentando seu rock com uma gama incrível de elementos que integram Post-Hardcore, Rock Experimental, Indie Rock e muitas outras influências, tornando o som dos caras algo fresco e muito bem tocado. As ótimas Animalia/À Distância e Passional mostram de forma agradável a cara da banda, que mesmo com apenas um CD, já figura a uma das grandes revelações nacionais.

Sem mais delongas, a Dead Fish entra no palco pra fazer um dos shows mais icônicos da banda aqui no Rio de Janeiro. Claro, por todo o momento no qual o país se encontra, mas também pela parte musical. Explico: A banda estava com raiva. E acho que isso passou para o que os caras estavam entregando no palco. O show começa com Bem-Vindo ao Clube e mostra como os capixabas dariam as caras no Circo Voador. O ciclo interminável de moshpits e rodas de pogo continua com músicas como Oldboy, Molotov e Não, que integraram a primeira parte do show.

O álbum Vitória, lançado no final do ano passado, também fez parte do setlist com músicas como a agressiva SelfEgoFactóide, que fez o circo voador virar uma grande roda e causou uma das maiores epifanias do dia e a ótima Nous Sommes Les Paraibes que traz as já críticas político-sociais da banda de uma forma bem construída. Rodrigo falou sobre o respeito que o público mostra pelas mulheres hoje em dia na cena hardcore e citou algumas palavras sobre luta, política e resistência.

As mais conhecidas não ficaram de fora: Zero e Um e a pegada hardcore já tradicional da banda, Você e Queda Livre foram algumas lembradas. Apesar das duas últimas citadas terem uma pegada diferente do que normalmente é apresentado, é interessante ver o Dead Fish fazendo algo mais lento, mas com um trabalho musical mais complexo e de ótimo gosto, algo que às vezes, em meio a todo caos e violência das músicas da banda, passa despercebido.

Seguindo para a parte final do show, tivemos as incríveis Venceremos fazendo um singular momento com os versos Faça por você/faça por todos nós/ faça por ninguém/ venceremos!, Proprietários do Terceiro Mundo e Eleito por Ninguém abrindo rodas gigantescas na lona e Mulheres Negras, criando um momento ímpar: Nos versos finais Se viver é resistir/Então será…/E ai poderemos sorrir como mulheres negras/Que apesar de todo sofrimento se negam a chorar, muitas mulheres subiram no palco, foram respeitadas pela parcela masculina do show e cantaram o verso finalizando com um discurso de empoderamento feminino e negro. Incrível atitude da banda respeitando o lugar de fala, incrível atitude do público, das mulheres que subiram no palco e um momento para ficar na história do Circo Voador e dos capixabas.

O show finaliza com Sonho Médio e o público sai extasiado com mais uma apresentação belíssima da banda do Espírito Santo nas terras cariocas. Apesar de o conjunto ser figurinha carimbada por aqui, os shows do Dead Fish nunca são monótonos, previsíveis ou descartáveis e o que se configura é um ritual de som e fúria. Quem foi, saiu de alma lavada e renovada para enfrentar o que tivermos que enfrentar pela frente no futuro do país.

DEAD FISH / 25 anos
Circo Voador, Lapa, Rio de Janeiro
Sexta-feira, 13 de maio de 2016